sábado, 3 de julho de 2010

A praça - requiem


Quando era miúdo, a minha avó forçava-me a ir com ela ao Mercado da Ribeira, ou à praça, como ela dizia, coisa que eu não gostava muito, e dizia-me ela com a sua sabedoria - um dia vais gostar de ir à praça. Acertou. Hoje não troco uma ida à praça, para escolher o peixinho vindo de Sesimbra, a carne do talho, onde já me conhecem os hábitos, o pão de Alfarim, os legumes-legumes. Tudo tem outro sabor. O peixe não encolhe, a carne tem sabor, a cebola faz chorar, e o pão não fica intragável ao fim do dia. Contudo prevejo que, com o rumo que a distribuição levou em Portugal, tudo isto venha a acabar. Hoje, na praça aqui da zona, assisti a duas birras descomunais de duas crianças, que aparentemente foram ao engano, levados à praça pelos avós, julgando que iam a um grande espaço. Esses miúdos não serão clientes das praças, por mais que os avós insistam.
Em recente reunião de trabalho que assisti, foram divulgados dados interessantes - 80% dos jovens não sabe bem o que é o comércio local, e dos que sabem, mais de 90% não o usam, preferindo ir mudar a pilha do relógio ao centro comercial, do que ir ao relojoeiro da esquina. O conceito de modernidade aplicado apenas no nosso país de iluminados, vai, a curto prazo, o de uma geração, entregar de mão beijada o monopólio da esmagadora maioria da actividade comercial, aos grandes grupos, e sentenciar a pequena iniciativa privada, que pelo cansaço, falta de modernização, apoios, sucessão e carga fiscal, vai fechando, contribuindo para uma desertificação do convívio de rua, de muitas áreas urbanas, ao contrário da prática dos outros países europeus onde existe um equilíbrio entre todos os agentes económicos. A quem torce o nariz, basta fazer uma pesquiza sobre a distribuição comercial nos países nórdicos...
Agora vou acender o lume para grelhar as douradas escaladas e as lulas, que o Sr.Joaquim me garantiu serem mesmo de mar, e eu acredito, sem filas, talões e outras complicações.

Sem comentários:

Enviar um comentário

Sputnickadelas