domingo, 29 de julho de 2012

Alternativas


Por via das vontades, ou da falta delas, que por via do desânimo da crise nos empurra para outras rotinas, decidi-me hoje a não ir à praia. Ou melhor, a não ir à praia propriamente dita. permitindo-me ao pequeno luxo de pegar no carro para ir a qualquer lado, parto assim sem destino, em velocidade de cruzeiro, aquela típica de condutor de domingo que irrita qualquer um, contudo, não esquecendo o kit banho, não fosse apetecer um mergulho. E não é que em Alcochete se me depara uma praia à beira Tejo plantada, ampla, limpa, e convidativa. E fui a banhos. No regresso não deixei de provar as mesmas águas, na zona do Seixal. Tal como outros tugas constatei a boa opção que estas praias, antes ambandonadas, mas agora muito concorridas, constituem, às congestionadas praias oceânicas, seja porque se quer poupar umas coroas, ou simplesmente, porque não estamos para as confusões das bichas, e afins. E que não se pense que o Tejo por ali se apresenta em mau estado. Pelo contrário, diz quem tem muita idade que as suas águas voltaram à vitalidade de há cinquenta anos, que o digam as ostras, as amêijoas, os chocos, as douradas, os robalos, e acima de tudo, os golfinhos.

sexta-feira, 27 de julho de 2012

o pagador de promessas

Já devo ter convivido, decerto, com este pequeno livro, há muitos anos. No entanto só ontem dei por ele, entre uns quantos que a senhora minha mãe decidiu mandar-me, quem sabe porque decidiu mudar os móveis de lugar. Pareceu-me apropriado - queria um livro de fácil leitura, para devorar em dia de folga. A informação na contracapa falou da importância e dos prémios desta obra. Em meia-manhã estava lido. Uma peça de teatro onde se espelha com muita sabedoria e humor, a vida das gentes da Baía, ao melhor estilo Jorge Amado, tocando a fundo nos poderes da autoridade politica, policial e da igreja, bem como na habilidade jornalística em manipular informação. Actual, portanto, este pequenino livro.

estado d'alma II

A forma encontrada para não se dar em doidinho com as agruras e os pedregulhos da vida,tem sido a de desligar quando se consegue, do constante pensamento do que aflige no presente, que, somado ao vislumbre do futuro, toma proporções assustadoras levando a um estado de espírito, onde não se distingue a fronteira entre o pessimismo e o realismo. As pausas, ou as posições off são no momento muito mais do que um direito. Tornaram-se como que um tratamento. Veremos se será o suficiente para nos manter a flutuar.

quarta-feira, 25 de julho de 2012

estado d'alma

é mesmo por aí...

segunda-feira, 23 de julho de 2012

partidas

Não se escolhem pais, mães, ou filhos. Os nossos são os nossos, e ponto final. Nem sempre tive uma relação muito próxima com o meu pai, por força das escolhas da vida, mas sempre gostei do pai que tive, lamentando a sua partida cedo demais. 
 
Dos vários amigos que tive, e tenho, o pai de um deles, destacou-se sempre como meu preferido. Digamos que em muitas ocasiões, a autoridade, os conselhos e a presença que exercia sobre o meu amigo, me tocava por tabela. 
 
E que amigo esse, logo o mais importante, o mais presente, o mais confidente. Com ele partilhei as muitas audições aos vinis sagrados, bem como o início das lides musicais, que se prolongaram até perto do virar do século, atravessando muitas formações. Fomos parceiros de muito mais do que na música, e não tenho dúvida em afirmar que pouco ou nada escondíamos do outro. Quando casei, ele foi o meu padrinho, e quando ele casou, eu fui o dele. 
 
De certo modo, a partida do seu pai, é para mim, a perca de outro pai que silenciosamente adoptei. Justamente no mesmo dia em que me vieram parar às mãos fotografias do escaldante ano de 75, onde eu e o meu padrinho, afilhado e amigo abrilhantamos um pouco concorrido evento rosa.

outros povos, outras ideias

Um ano após o massacre na Noruega, realizou-se no local onde ocorreu a tragédia, uma simples e singela homenagem. Pelo que pude observar, para além da simplicidade realçava a partilha do momento, no qual, todos, sem excepção comungaram o mesmo sentimento. Não pude deixar de fazer um exercício de imaginação: e se isto tivesse acontecido aqui? como seria esta homenagem? 

Se é certo que em qualquer lugar do planeta pode aparecer um terrorista, é também certo que o cenário seria radicalmente diferente. A primeira coisa que o nosso governo iria fazer, a fim de se auto-promover, seria mais uma obra com assinatura público-privada, quando maior e mais espampanante melhor, tudo em nome das vítimas. Um mausoléu se ergueria na ilha, construído à pressa, e ignorando as derrapagens financeiras, e outras prioridades nacionais.

Ao cabo de um ano, viriam os governantes em peso, e os seus assessores, e as forças da ordem, e as forças armadas, mas só gente de topo, cada um no seu carro preto, alemão, claro está. Haveriam discursos pomposos e enfadonhos, em vez de sinceros e sentidos depoimentos. Paulo Portas, anunciaria quem sabe, a compra de um porta-aviões à China, ou a construção de uma prisão à prova de bomba nuclear, para combater o terrorismo.

Em vez de canções belas e simples, num palco também ele simples, teríamos um aparatoso e monumental espectáculo, ao estilo rock in rio, com artistas pagos a preço de ouro, para virem cantar e chorar lágrimas de crocodilo. Portugal marcaria, pelo menos para consumo interno, e mais uma vez a diferença, pela mania das grandezas, dos compadrios e do oportunismo. Talvez a Fátima Lopes, ou a Catarina Furtado fossem convidadas a entrevistar um ou outro familiar das vítimas, porque a dor em directo também capta votos.

Faríamos a coisa em grande, como é do nosso hábito fazer obras e aquisições sem nexo, e fora de qualquer contexto útil, seríamos recordistas e ridículos como sempre, contrastando como sempre dos povos que em qualquer circunstância, se mostra adulto e humilde. Porque não tenho a mínima dúvida que na Noruega, não existem mega-estádios de futebol ao abandono, panzers a enferrujar, estradas, e auto-estradas vazias, e submarinos inúteis, pelas mesmas razões que os levou, ontem, a relembrar as suas vítimas, simplesmente.

sexta-feira, 20 de julho de 2012

Gritos Mudos

Creio não haver nada mais atroz do que a tomada de consciência de que, por via da doença implacável, se vai morrer em dias, meses, quando muito. Consciência essa que não larga o pensamento, de que tudo à volta se desmorona, e se olham as pessoas sempre com a sensação de ser a última. Bem como  na contemplação de tudo o que é belo redor, com o receio de que esse olhar seja o derradeiro. A sentença está dada, e a angustia da espera é do mesmo tamanho da alegria na conquista de mais um dia.

Esta traição da vida, presenciei-a em pessoas chegadas. Vi-as definhar dia a dia. Impotente nas palavras de ânimo ou conforto, dado que seria um insulto qualquer palavra acenando esperança, restava-nos o silêncio, e  quase certeza, de que aquele momento não se iria repetir.

A vida tem muitas formas de nos ser tirada. Quando não na doença, também pode ser reclamada aos pedaços, dia a dia, nas dificuldades que se nos deparam, tal como degraus que cada dia desses dias se vão transformando em muros. 

Não tenho a mínima dúvida de que a par da multidão que por via da doença aguarda o dia da sua partida. exista outra não menor multidão de gente, que assiste impotente e exausta ao definhar da sua vida, dia a dia, sem vislumbre de soluções ou alternativas.

Conta a História recente, das razias e massacres levadas a cabo pelos ditadores da época, que dizimaram milhares de pessoas. Contará a História futura de como gerações de governantes levaram ao desespero, com as piores consequencias, outros milhares de pessoas que, tal como aqueles cuja saúde lhes faltou, apenas queriam viver, com dignidade. 

quarta-feira, 18 de julho de 2012

ao léu

Há pequenos prazeres, tão simples, que por vezes esquecemos, e que se recordados nos transportam à idade da meninice, quando era natural a sua prática. Recordo-me de em criança, na ausência de outro modo de me refrescar, pegar na mangueira de rega do pequeno quintal da minha avó, e em pelota, me deliciar naquele esboço de cascata de pobre. Que bem que aquilo me sabia. Ontem foi noite de reedição, pegar na mangueira, e ali no escurinho da noite, refresquei-me, ao léu e sem véu. Porque afinal, de vez em quando sabe bem voltarmos a ser crianças, nem que seja em fugazes momentos.

o Assunto dos Assuntos

Fartos que todos estamos de ouvir, barafustar, comentar, o polemico caso do Relvas, convém não esquecer que:
Uma taça de vinho, contendo metade da sua capacidade de Quinta do Carmo, pode estar meio cheia, ou meio vazia. Contudo, uma meia mentira nunca poderá vir a ser uma meia verdade.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

80-20

Defendem alguns que existe na fórmula 80-20, o resumo da relação dos que produzem, os 20, contra os que vivem à conta, os 80. Creio ser generoso este número. Inclino-me mais para os 90-10. A forma continuada de tentar o equilíbrio na corda bamba, desgasta, e desanima muitos dos que, dia a dia contribuem para o bem estar daqueles que se acomodam impunemente na maioria. E em cada dia desse dia a dia, cresce uma revolta, muda, por enquanto, e uma convicção cada vez maior, de que isto tem de mudar. A bem, ou a mal.

sexta-feira, 13 de julho de 2012

sedentários

Brilhante um pequeno comentário que passou há pouco na comunicação, sobre a pegada ecológica, tão em voga nos nossos tempos, defendida por um lado, pelas mesmas pessoas que por outro lado, mais a atacam. Os exemplos foram vários - porque fazer viagens de finalistas, despedidas de solteiro, de lua de mel para bué bué de longe, quando aqui tão perto, havendo a essência - amor e alegria - se pode ser igualmente bem sucedido? E no dia a dia, que nada se faz, a não ser de carro? Seja para o passeio, para a night, para as compras, há que dar à chave e poluir mais uma bocadinho. O conselho pareceu-me utópico, e decerto insano parecerá a outras gerações - Há que repensar novas variantes, ou regressar a antigos costumes. Nuns casos pela coerência à pegada, noutros, porque os anéis se foram. 

quinta-feira, 12 de julho de 2012

soldadinhos de chumbo

Embora não concorde, tenho de admitir que se eu fosse membro de um governo, não andaria de mota, nem de carro popular. Creio que se pudesse, não para ser diferente, mas porque gosto, andaria de Land Rover. Diriam os contribuintes, mas porque anda o Ministro Sputnick de todo-o-terreno, se o caminho casa-assembleia é todo alcatroado? Estaria eu a roubar os meus súbditos? Aqueles que me deram o seu voto para lhes defender os costados? Afinal, um governante não pode ter os seus caprichos? Invoque-se a sensação de bem-estar que conduzir um Land Rover proporciona, e que, reflectido num melhor desempenho governativo, a todos iria beneficiar. Calar-se-iam as vozes. Mas outros se levantariam, os do contra - o gajo anda de gipe, porque recebe luvas da marca, e lá se estragava o alibi. É nesta fase que me encontro. Primeiro, tentei entender porque raio comprámos dois submarinos que não atracam em lugar nenhum, que não dão tiros, e se os dessem, a quem os dariam. Agora vim a saber que temos outro buraco pior - o dos Panzers. Pesquizei, pesquizei, e não vejo outro motivo para a sua aplicação no nosso burgo que não seja, claro, pelas luvas. E pela mostra na matéria televisiva, em ambos os casos, a luvas, bateram na mesma Porta. Estamos bem lixados. Prevejo que em breve chegue por aí um porta-aviões, recentemente encomendado na China.

terça-feira, 10 de julho de 2012

primeiro de Agosto...

... primeiro de Inverno. Sempre foi assim, e veremos se assim será, dado que tudo tem sido no inverso do esperado. Caso para lembrar do dito - quando pensamos que sabemos todas as respostas, a vida chega de rompante, e zás, muda todas as perguntas. Assim anda o clima. Baralhado, confuso, incerto, nem carne nem peixe. Andam as plantas, e todos os bichinhos à nora, dado que a eles não lhes é dado o calendário. A natureza rege-se por leis, que não as nossas. Nós, os que sabemos das coisas por calendário, também andamos um bocado à toa, sem saber se logo à noite se leva a t-shirt, a camisola grossa ou o guarda-chuva. Já não bastava a merda de vida que os políticos teimam em nos impor, e ainda por cima nem sequer vamos ter um Verão digno. Ou quem sabe, o vamos ter no São Martinho, já com as árvores no cair da folha. Chamem-me antiquado, mas do que gosto mesmo é das quatro estações. Distintas. Previsíveis. Na data. Imponentes e inequívocas.

segunda-feira, 9 de julho de 2012

o não governo

Sem querer sem tendencioso, pois já por aqui disse, que da esquerda à direita, os partidos sempre se entenderam nos bastidores, acho que o principal partido do poder está a conseguir o mérito de ser pior e mais nocivo, do que o seu principal partido rival. Tarefa difícil. Não fosse o caso dramático, dariam vontade de rir as inúmeras e infelizes frases, tais como, não tenho dinheiro para despesas, ou a recente, isso é uma não notícia, quando nesse preciso momento, mais de metade dos jornais, e quase todo o universo webnacional, comenta o canudo-relâmpago do Relvas. Falta o Eça, para comentar, tamanha palhaçada. Só que, fazer ruído não é o caminho, dado que as pessoas já não estão apenas incomodadas, estão desesperadas, e não demorarão muito a passar da vaia e do insulto, à agressão. Pelo que não demorará muito tempo em que as saídas destes senhores se vão limitar a espaços restritos, bem guardados, e recheados, de pêpêdêzinhos, e de cêdêéssezinhos histéricos a dar vivas ao governo, em transmissões televisivas contínuas. Nada de novo, nada que não se tenha visto no tempo do Salazar e do Américo Tomás. 



sexta-feira, 6 de julho de 2012

agora parece-me tarde II

A notícia deveria chocar, mas não choca, afinal, todos, conformados ou não, a entendemos - os portugueses estão a diminuir. Não se reproduzem como outros povos. As razões são conhecidas. Não se aconselha ninguém de bom senso, a ter filhos, dado que o bom senso não impera naqueles que decidem os nossos destinos. Dizer a um jovem com emprego descartável, para casar e ter filhos, não é hoje, de maneira nenhuma igual ao que se dizia nos tempos da minha avó - nasceu! há de-se criar! Pior que uma situação fruto da crise, poderá vir a ser a falta de interesse das futuras gerações, em ter filhos, seja por motivos económicos, culturais, ou por opção, entre o sabor único de ter um filho, ou (para os que podem) o corre-corre entre saídas para cinemas, eventos, concertos, viagens, discotecas, e afins, aliados às despesas da nova vaga. A saber, um ou dois telemóveis, internet, tv cabo, carro, roupinha de marca, que junto às despesas clássicas, não deixam orçamento nem vontade para pensar em descendência.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

agora parece-me tarde

Depois da invasão permitida às grandes superfícies, pelos quatro partidos da vida airada, este cartaz, cheio de boas intenções peca. Por tardio. A economia gerada já era. Se bem que alguns resistentes ainda vão pagando religiosamente, o IVA, o IRC, o IRS, o PPC, o PEPP, o IMI, a derrama, a SS, o contabilista, as licenças camarárias... Os postos de trabalho, também já tiveram os seus dias, pois se a malta se deslocou para as superfícies, o trabalho diminuiu, ou acabou. Logo, os postos do mesmo, idem. A vida na cidade? Pois, vai ser uma desolação. A saudosa lembrança da rua cheia de comércio local, de pessoas a falar no meio da rua,    e tudo o que mais vemos nos outros países, já era. ERA é o que mais se vê nas lojas fechadas, nas ruas onde as pessoas depositam o seu quatro rodas e sobem com as compras para os seus casulos. A classe política instalada, bem como uma população ávida de tiques de novo-riquismo abriram as portas a um modelo de comércio único no mundo, o qual, já começa a dar sinais de fraqueza, contudo, permanecendo milionário, se comparado com o estado moribundo do agora invocado comércio local. Pior que tudo, a nova geração, na grande maioria constituída por jovens sem emprego, nem sequer sabe bem o que é "comércio tradicional". Para eles, é algo assim tipo cena do passado, na onda do "Evaristo, tens cá disto". 

estranhos regressos

Alheado do local onde me encontro, enquanto espero que o dono do restaurante termine o seu almoço, vou olhando a esplanada e o bem tratado relvado ali em frente. Recordo que por ali ficava o "meu" Liceu, e num ápice regresso aos bons momentos do passado, na minha espera. Desde os vinte e cinco tostões roubados nas mesas do Central para custear os jogos de matraquilhos, aos conturbados períodos de aulas antes e pós 25 de Abril, às primeiras aulas visuais de guitarra, aos namoricos, tudo me passou na mente enquanto me perco a olhar para não sei onde, enquanto o dito senhor não aparece. Eis que ele chega, e antes de chegarmos ao assunto propriamente dito, jogamos um bocado de conversa fora, afinal ele também andara por ali na sua juventude. Depois, fomos ao assunto, e acordou-se que, em breve faremos a experiência, levar a música ao vivo até aquele espaço. Deve ser um bom misto de emoções. Aguardemos.

terça-feira, 3 de julho de 2012

Estado novo = novo Estado

Das poucas pessoas que por aqui passam, algumas poderão dizer - credo, este blogue anda tão mórbido. Mas se por aqui se escreve aquilo que nos vai na alma e nos afecta, o que a seguir se vai descrever encaixa perfeitamente, em nome da coerência.
Ontem, no maior centro comercial da capital, a meio da manhã, ouviu-se um estrondo seco e poderoso. Uma pessoa acabara de se suicidar, deixando-se cair do piso mais alto. Lojistas disseram que não é o primeiro, uma delas já contou quatro. A ordem é de sigilo. Não querem que a moda pegue, é dá mau nome ao Centro. Também as autoridades recomendam o silêncio - o acto, pode encorajar potenciais suicidas, ou, dito de outra forma, pessoas que em desespero, não encontrando razão e condição para ficar, decidem partir. Diz quem tem acesso a informação privilegiada, que a esmagadora maioria das causas tem a ver com a crise que nos impuseram, por dívidas que não cometemos, é uma espiral perigosa, dado que é galopante, tal como se verifica na Grécia. Em tempos do estado novo, anulavam-se pessoas à bruta, fossem eles presos políticos, ou soldados enviados para África. Hoje, no tempo do novo estado, cozinham as pessoas em banho-maria, e lentamente, empurram-nas para o beco onde nunca pensariam ter de entrar.

segunda-feira, 2 de julho de 2012

a vida dos outros

Das voltas de bicicleta impostas para depois do jantar, na eterna cruzada de contrariar o ócio do sofá, do pc, ou da cama, dou comigo em rotas repetidas, as que são mais seguras, dado que à noite, se todos os gatos são pardos, também o são, os ciclistas. E porque os caminhos se repetem, também se repete a paisagem urbana. Já confirmei que a dado momento está um velhote à janela, mais à frente rega-se o jardim, as varandas, e as marquises sem cortinas deixam desvendar as gentes entre paredes, que parecem repetir-se nas tarefas. Decerto que destes observados, alguns me observam também, bem como decerto pensarão, ao ver-me pedalar - lá vem aquele gajo outra vez armado em ciclista. E lá vou eu, e lá ficam eles, cada qual com os seus pensamentos, e os seus poréns, na rodinha da repetição. Porque se o sol nasceu hoje, certamente nascerá amanhã, e não havendo mudança de planos, quando a lua sair, lá estarão eles nos seus postos e eu passarei por eles, a pedalar.