sábado, 27 de fevereiro de 2010

Lápis Azul


Em jeito de tertúlia, meio acesa diga-se, ontem em certo restaurante, de porta fechada, soltou-se o vício do cigarro, e os balões de wiskies, aguadentes perderam-se no nevoeiro provocado pelas boca ávidas de um bom trago e umas boas passas. Palavra puxa palavra sobre o tema, e o tema de discussão, por causa da proibição de fumar em recintos fechados como aquele, foi parar à palavra - censura. Da censura, ao Zeca Afonso, ao Sérgio Godinho, à PIDE, ao Sócrates, ao Mário Crespo e à Moura Guedes, e afins, foi um pulinho, e quantos mais cigarros se fumavam e o líquido descia pelas gargantas, mais as opiniões se incendiavam, e eu, ali numa de arrumar a tralha, e rumar ao ninho, pois esta semana que passou quase me mandou ao tapete.
No meio das considerações, afirmações, suposições, do ilustre painel, alguém se lembra de perguntar a opinião do músico, e lá fui entrando na conversa, revivendo os meus tempos de liceu, e rebuscando qual o acto de censura que mais me marcou, até que me veio claramente à mente, qual foi esse momento, o que deixou a minha reputação de fâ do Zeca, do Sérgio; do Ary, do Palma, assim meio abalada, pois de facto, o que me deixou mesmo danado nada tem a ver com o que é de costume, mas sendo a verdade, houve que contá-la, pois afinal fui inquirido - quando os Beatles terminaram, os seus elementos depressa gravaram singles, demonstrando que o sucesso também continuaria a solo, e assim foi, George Harrisson bombou com o My Sweat Lord, Paul McCartney com My Love, e o John Lennon gravou Mother. Acontece que o Mother era um single polémico, o tema Mother começava com uma interminável séria de badaladas de sino, a letra não era muito consensual, e o pior era o lado B. O lado B não era cantado, mas sim gritado, berrado, esganiçado, com a palavra que dá nome ao tema - Why. E é Why a única vociferação que a dama Yoko Ono, companheira do John, profere ao longo de todo o tema!!! É um vómito músical aquele Why, mas como na época o casal queria ser polémico, e eu abraçava as causas polémicas, e etc, escutava aquele single com alguma religiosidade, em alto som. Até ao dia em que a minha mãe sobe a escada a correr, a ouvir os gritos da Yoko, a pensar que eu estava a sodomizar alguma namorada...
O resultado, foi que fiquei sem o disco. Foi-me confiscado, e não mais soube dele. E o pior - fiquei proibido de comprar discos por um mês, e com o aviso - se compras mais porcarias daquelas, tiro-te o gira-discos.
É censura. Da pura.
Mas mãe pode.

2 comentários:

Sputnickadelas