sexta-feira, 18 de junho de 2010

Amizades

A, muito longe vão os tempos em que iniciámos a nossa viajem pela música, numa arrecadação, em que eu tocava com a minha viola de seiscentos escudos e som duvidoso, e tu, numa tentativa de bateria feita de baldes de Skip, e de plástico. Tão longe quanto as horas que juntos, sem dizer palavra, gastámos os vinis dos Genesis, Pink Floyd, Yes, Supertramp, Deep Purple, Uriah Heep, Santana... A tua primeira bateria lembro-me, era azul, fomos buscá-la à Custódio, no Chiado, e de lá veio também a minha Ibanez. Entrámos juntos para o primeiro conjunto, onde um amplificador dava para duas guitarras e dois microfones, e o do baixo, só funcionava na vertical, pendurado na parede. A partir daí sempre que um era chamado para outra banda, logo tratava de arranjar lugar para o outro, e assim foi durante muitos anos. Os amigos acostumaram-se a ver-nos sempre juntos, a tocar juntos. Criámos uma modesta legião de apoiantes fãns. Fora da vida musical, sempre fomos aqueles amigos das farras, dos acampamentos, das bicicletas, dos bailaricos, dos concertos, dos desabafos, até mesmo, na nossa fase de juventude política. Depois vieram as namoradas, os casórios, os filhos. Foste meu padrinho de casamento, e eu o teu. As músicas continuaram, os palcos. as amizades, agora mais dispersas, com as famílias. Aqui e ali uma ou outra separação. Ou pausa. Até que há cerca de dez anos, escrevemos uma longa pausa, radical, total, que só foi quebrada no funeral da tua mãe. Por vezes é assim, as fatalidades aproximam.
Nos primeiros tempos era meio estranho, os amigos que nos conheciam sempre me perguntavam por ti, e eu dizia, não sei. Depois inventava uma qualquer desculpa sobre os rumos da vida. Não queria dizer que deixaras de me dirigir palavra. Imagino que para ti, fosse também, estranho, complicado.
Ontem ligáste-me. Quizeste saber de mim. Se ainda toco. Que estás disponível para tocar. Se estou bem. Se ainda tenho o velho Yamaha. Que tens material para tocar. Três baterias. Na realidade, quizeste saber da nossa amizade, e anunciáste um encontro, para saber novidades, da malta, e porque não, de nós. Amigo A, a porta está sempre aberta, pois afinal, nunca a fechei.
Para começar, estou a pensar numa ida a Almada Velha.

2 comentários:

  1. Até as mais perfeitas coisas podem ter interregnos. Que nunca serão eternos, se as coisas valerem a pena. Puxa. Tou filosófica hoje :)

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  2. As verdadeiras amizades são assim, mesmo ausentes, estão muito presentes.
    :):)

    PS: e boas músicas.

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Sputnickadelas