quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

pegada lusitana

Há dias, escutei uns entendidos, a aconselharem o povinho a não deixar a sua pegada ecológica, no planeta, ou no mínimo, a deixar o menos possível. Verifiquei a nacionalidade, eram portugueses, sim senhor, alguns até com capacidades de decisão, e de há muitos anos a esta parte. Chamei-lhes débeis.
Contudo, cheio de fé e boa vontade, tentei aderir, virtualmente, à causa, mas tornou-se-me difícil nuns casos, e impossível noutros. É que para adquirir alguns bens essenciais à minha permanência neste planeta, tenho de me deslocar. De carro. Para obter alguns serviços, reparações, e afins, tenho de me deslocar. De carro. Eu até podia ir a pé, mas fica longe. São quilómetros, e não metros. De biciclete, nem pensar, há muitos carros, nas filas, que afinal carregam pessoas como eu. Deslocando-se. Em carros. Repisando a pegada. Como uma bota botilde. Na medida em que as ruas das minhas cidades, vilas e aldeias, vão ficando desertas, desses pequenos locais, onde antes se podiam resolver as nossas necessidades, crescem os grandes e iluminados cogumelos. São lindos, t~em ar de hotel, de free-shop, de modernidade, e qualidade de vida. E lá vou, lá vai o vizinho, a rua inteira, de panfletos na mão, lista das faltas, parafusos para amostra, roupas para troca, de cogumelo em cogumelo, em busca dos pertences. Irrita-se a malta, mas filas, dana-se a malta, nos parques, para estacionar é um castigo. Empurra-se a malta, feroz, atarefada, frustrada, porque o tempo não chega, e o dinheiro muito menos, e a pegada que não pára de crescer. No acto de pagar, degladiam-se os consumistas. Os seus carrinhos de compras mais parecem carrinhos de choque. Impacienta-se a malta, porque querem ser despachados primeiro que os outros, e correrem para o seu veículo poluidor, e por lá depositarem umas coisas que fazem mesmo falta, e outras que nem por isso. Mas eram tão baratas. Tão irresistíveis. Mais pegada.
Inteligentes, os da Europa. Inteligentes, os do tempo da minha avó, que saía à rua, de chinelos, e tinha na rua onde morava, ou ruas limítrofes, tudo e apenas aquilo que lhe era necessário.
Tristes e atrazados, aqueles que vêm dar os conselhos e recomendações. Porque agora, não há volta a dar. Folgo em constatar, embora pálidamente, que o meu país é aquele que foge à regra. Folgo em verificar in loquo a qualidade de vida e o bom senso, de outros povos, de outras culturas, tão longe da nossa, e tão perto afinal, visto que dizem europeus. Folgo em ver que tal como no tempo da minha avó, que as pessoas tinham sorrisos nos rostos, aos domingos.

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